sábado, 4 de dezembro de 2010

#8

Ontem, assim sem avisos e cerimônias, recebemos a visita da minha avó. Minha avózinha. Moramos um do lado do outro, no mesmo terreno. Mesmo assim quase nunca nos vemos. Ela diz que trabalho muito, “ontem você chegou onze e vinte da noite, não é, filho?” e que não se importa, ora por mim sempre. Que sou um bom rapaz, não puxei meu pai.
Segundo minha avózinha, meu pai nunca se esforçou pra ser bom. Brigava com os vizinhos, subia no telhado pra atirar filhotes de gatos nas pessoas da rua. Passou uma noite na delegacia uma vez por ter roubado o toca fita de um carro. Ele nunca fez questão de ser educado, de mostrar os dentes pras visitas de domingo como eu.
Quando estava no ginásio, meu pai se envolveu numa briga – o motivo não sei, talvez futebol ou jogo de gude. No dia seguinte, minha avózinha o levou até na porta do colégio com um laço de fita na cabeça e uma saia. Deixou ele vestido de menina na entrada e ficou do outro do lado da rua observando se ele não ia fugir do castigo. Todos os colegas de classe o viram travestido, apontaram e deram risada. Missão cumprida. Às dez horas, ela pegou meu pai pela mão, arrancou o laço da cabeça dele e voltaram pra casa. Nessa época, pra ajudar a colocar dinheiro em casa, minha avó passava camisas para a família Amaral. Na falta outro instrumento adequado, usou o cabo do ferro de passar roupa pra dar uma surra em me pai, “E espero que tenha aprendido a lição! Porque você não é igual o Marinho, comportado igual?”.
Nessa época, dos castigos e das roupas da família Amaral, minha avó não tinha esse problema na coluna. Ontem, quando entrou em casa, o fez com muita dificuldade e com ajuda de uma bengala. Foi levando as mãos nas paredes da sala até chegar perto do sofá, onde sentou com muito custo e ficou recuperando o fôlego por alguns minutos. “Você vai chegar lá também, meu filho, se Deus quiser”, disse minha avózinha.
A razão da visita era um tanto urgente, apesar de pouco nobre. Minha avó desembrulhou um pacote e mostrou pra todos que estavam na sala – eu, pai e mãe. Queria entender como se fazia pra usar aquela fralda geriátrica, era pro meu avô. “O velho deu pra mijar nas calças agora, não aguento!”. Disse que meu avô já tinha tentado usar duas fraldas e as inutilizou depois de colar as fitas adesivas nas partes erradas. “E vocês não sabem, o pinto dele está deste tamanhinho”, indicava com a mão, “não serve mais pra nada, só pra mijar nas calças que eu lavo!”.
Meu avô trabalhou a vida toda, era motorista até os oitenta e quatro anos. A incontinência urinária deve ser por conta da idade e dos tantos anos sentado dirigindo. A próstata não aguentou, provavelmente. Ficava semanas fora de casa fazendo carreto ou levando um caminhão de piche. Talvez ele não saiba, mas minha avó, coitada, tão sozinha, recebia com certa frequência visitas do compadre Mário. Quem sabe, entre um café o outro, ela e o compadre conversassem sobre a vida e os filhos. Ou sobre formas de aplacar a solidão. O compadre Mário morreu num dia 21 de maio há quase trinta anos. Dizem que minha avó passou mal no enterro, precisou de água com açúcar. Coitada da minha avózinha, tão sozinha.
As fraldas geriátricas foram compras pela tia Regina, irmã do meu pai. “Tão prestativa a Regina, sempre foi! Fez questão de comprar a fralda mais cara pro pai!”, falou a avózinha. Tão feliz tia Regina. Formou-se no magistério, minha avó achou que era o melhor pra ela. Deu aulas no estado de História e Geografia até se aposentar. Com o dinheiro da aposentadoria sustenta uma vida estável ao lado do marido e do filho, em um sobrado de esquina. Tão realizada tia Regina.
Ela começou a profissão do magistério na mesma época das roupas passadas para os Amarais e as brigas do meu pai. Quando recebeu o primeiro salário, minha avó ficou com todo o dinheiro. Diz que precisava ensinar à tia Regina o valor do dinheiro. Depois do quarto ou quinto salário, passou a ficar só com metade, para as despesas da casa – e uma viagem que fez com o compadre Mário pra Foz do Iguaçu. Fez bem a minha avózinha. Não fosse isso, se não tivesse se privado dos prazeres do dinheiro, tia Regina não teria um sobrado em um bairro privilegiado, ao lado do filho e marido. Que vida feliz tem tia Regina.
O marido dela, Celso, é de família humilde, mas conseguiu subir na vida. Os dois namoraram por doze anos antes do casamento. Tiveram apenas um breve rompimento dois meses antes do enlace. Celso era professor em uma faculdade, um rapaz esforçado, dizia minha avó. Toda a noite chegava tarde, mas passava na casa dos meus avôs para ver tia Regina. Uma noite, ele esqueceu a carteira na mesinha da varanda. Tia Regina achou um bilhete escrito por aluno, perguntando quando poderiam se encontrar novamente – “um professor nunca tinha me ensinado tantas coisas antes”, leu. Com o achado e os rumores, Regina e Celso desmancharam o noivado. Mas minha avó, tão sagaz, tão correta, foi na casa de Celso e implorou de joelhos que os dois reatassem. Afinal, Regina estava com vinte e sete anos e ficaria pra “titia” se não casasse logo. Graças à minha avózinha eles se casaram. Tia Regina, bem aconselhada pela minha avózinha, numa mais mexeu na carteira do marido. “Que coisa feia, filha!”
Depois de alguns minutos lendo a embalagem e explicando, minha mãe conseguiu explicar didaticamente o uso da fralda geriátrica para a avózinha. Como abrir a fralda, colocar o pinto no lugar certo, acomodar o saco escrotal, ajustar as abas no corpo, tirar a fita adesiva, ajustar na cueca. “Mas o pinto do velho tá desse tamaninho, vai escapar e mijar tudo de novo, velho porco!”, riu minha avózinha. Meu pai, constrangido com a situação, com a exposição das condições do membro do pai na nossa sala, não se segurou. Pediu para minha avó parar com aquela humilhação. Ela, minha avózinha, não disse mais nada. Levantou do sofá com muito custo, ajuda da bengala e mãos na parede. Saiu pala porta da sala, se apoiou na janela e disse para meu pai “Você não tem jeito, nunca vai ser bem educado igual o Marinho”. E foi embora minha avózinha, tão espirituosa.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

#7

Queria não acreditar na justiça divina e desejar o teu mal sem cerimônias. Ter forças pra pedir ao universo que teu ventre fosse seco, que nada daí saísse quando assim você quisesse, quando os canários nas gaiolas e os mimos não fossem mais suficientes. Meu medo é que esse desejo se volte contra mim e caia na minha vida como uma bolsa cheia de algum líquido viscoso, de sangue ou como a bexiga de um animal cheia de urina. Seria sim um acontecimento, finalmente um acontecimento.
Não lembro de ter sentido a tua partida como agora, grave, quando você me acena de longe. Sei que assim, nessa perspectiva, perto da casa, do ventre, do domicilio conjugal, você é outro. Talvez um outro melhor, para você e para o universo – o universo de vocês. Melhor de longe, onde não consigo enxergar teus olhos gritando “juventude!” enquanto com teu corpo responde a outra coisa. Distante, não me obrigo a  ser plateia dessa performance diária, a obrigação da vida feliz.
Pensando bem, que teu útero seja, como nenhum outro antes, fantasticamente fértil. E teu rebento um espelho (pode ser desses que as mulheres guardam nas bolsas, junto com a escova de cabelo.) Na impossibilidade de parir o fruto por baixo, que seja pela boca ou algum dos teus outros oito buracos – cabe aqui o buraco que você tem no coração. Ali, na confirmação da vida plena, no dar à luz o teu herdeiro, espero que você o olhe no olho (como deixou de fazer comigo há tempos) e enxergue no reflexo a tua verdade.

sábado, 10 de julho de 2010

#6

Passei dois dias entre arrumações de armários e cômodas de casa. O espaço é mínimo e os parentes fogem pelo ladrão. Então guardo quase tudo que tenho em caixas, cada uma com sua etiqueta descrevendo o conteúdo. Passo horas a fio nisso, fazendo etiquetas naquelas maquininhas dos anos oitenta que grava letra a letra em uma fita plástica adesiva. Dá trabalho, mas depois de pronto fica bonito de ver. Aí, quando se quer algo de dentro, basta achar a caixa certa, procurar um canto vazio da casa e abri-la devagar - longe de qualquer pessoa. Mesmo assim corre-se o risco de alguém aparecer perguntando o que é aquilo ou o quê está fazendo. Na verdade, isso sempre acontece. Hoje, depois de tudo organizado, escrevi "Lembranças" em uma etiqueta e colei em uma caixa grande de plástico. Dei risada sozinho quando lembrei que não tinhada nada teu lá dentro. Nada me lembrasse você.

sábado, 19 de junho de 2010

#5

Já foi o tempo em que o La Flor de La Canela era um bom lugar para fazer amigos. Deixamos de bater cartão lá depois que virou um antro de jovens pseudo-poetas de esquerda, filósofos punheteiros e drogaditos pedindo dinheiro emprestado pra comprar pó. Queríamos novos ares! E seria aquela noite que nós quatro encontraríamos um novo bunker, uma nova segunda casa. O lugar era perto da Rua Carmen e foi indicado pelo Urbano, meu ex-vizinho de alojamento e colega na licenciatura. Eu sabia que o bar ficava duas ruas pra cima da Alameda, ou talvez três. Ou mesmo em alguma rua perpendicular à avenida.  Não lembro exatamente a época do ano. Provavelmente era junho, tinha o frio e a textura da sua jaqueta de brim nos meus dedos. Entre nós, o assunto era o fim do mundo. Algum meteoro ia atingir a Terra naquela próxima semana de 1999 e tudo seria ou fodido pelo tal ou engolido por uma onda gigante. A situação era de pânico descontraído, isso eu lembro. Tudo era motivo pra se fazer piada. Marcamos um ponto de encontro no limbo, caso o prenúncio se concretizasse. No fundo, aquela história toda me botava nervosa. Ria das piadas, mas de medo. Não gostava de pensar nesse tal dia. Imaginava minha mãe sendo dragada pelo recuo de uma onda gigante. O mar levando embora minha mãe e todos os meus livros junto. Um mar de livros e de mãe afogadas. Acho engraçado como o tempo muda a dinâmica das coisas. Quando nos conhecemos no último ano do ginásio não tínhamos nada em comum. E agora estávamos lá, os dois casais de namorados procurando um lugar pra viver aventuras em comum. E bem agora vinha essa tal onda pra destruir tudo. Paramos em frente a feira de artigos indígenas para atravessar a avenida e fiquei pensando que a onda levaria aquilo tudo embora também. As penas todas, os gorros de lã de ovelha, as pedras azuis com cara de índio.  Tudo se juntaria com o mar de mães e livros molhados. Percebi que não lembrava se a passarela de pedestres ficava a duas quadras pra direita ou pra esquerda. Sabia que era perto do prédio do Arquivo Nacional, mas na verdade não conseguia pensar em mais nada. Pensava que meu sapato não tinha salto nenhum e logo a água chegaria aos meus pés. Minha mãe sempre falava que uma mulher só é uma mulher quando de salto e maquiagem, mas nunca levei a sério. E pra que pintar a cara se logo mais aquela água toda estaria por ali, só poderia estar. Não era possível que a onda viesse de uma vez só. Já devia estar a caminho e pegaria a gente antes de acharmos o bar. Eu já não ouvia mais nada da conversa. Pensei em ligar pra casa, perguntar pra minha mãe se ela sabia nadar. Talvez soubesse, ela cresceu perto de uma barragem do Maipo na época em que era um rio que se podia entrar. Achei melhor tirar a dúvida e te pedi o celular emprestado. Expliquei que precisava falar com minha mãe, que era urgente e você me olhou com aquela cara comprida de reprovação. E a Dona Marina sabe onde fica o tal bar?, você me perguntou debochando. Eu não queria te contrariar, nunca quis, nem nunca soube como. Mas precisava ter certeza que ela sabia nadar. Caso não soubesse, talvez a mãe conseguisse se manter boiando em cima do sofá da sala. Era isso, se agarrar ao sofá. Ia avisar também que era importante ela bater os pés, pra pelo menos conseguir sair do lugar quando já estivesse em alto mar e não ser atingida pelas réplicas das ondas. O telefone tocou seis vezes. Na segunda tentativa, mais sete e caiu na caixa postal. Liguei de novo e deu ocupado. Tive certeza, já era tarde. No fundo daquele sinal de ocupado eu conseguia ouvir o barulho das ondas reverberando. A água entrando pelo telefone. Achei que o melhor a fazer era jogar seu celular longe, tentar impedir aquele desastre. Arremessei o mais forte que pude antes que aquele mar todo chegasse por ali. Aí você me agarrou pelo ombro, me chamou de estúpida e mandou eu me foder. Olhou bem pra minha cara enquanto repetia o quanto eu era estúpida e descontrolada. E eu vi que do fundo dos teus olhos duros a onda gigante já tinha chegado. Seus olhos boiavam num mar de páginas soltas, mulheres mortas e artesanatos indígenas e por mais que você me humilhasse ali na frente dos nossos amigos, eu vi que o fim estava próximo. Agarrei no seu braço, na sua jaqueta de brim que me doía nos dedos e não consegui te falar nada antes da morte anunciada, nem um adeus. Andávamos rápido, porque o fim estava perto.  Eu apertava seu braço e chorava por dentro. Chorei tanto por dentro que  morri afogada e você não percebeu. Nunca percebeu.

terça-feira, 15 de junho de 2010

#4

Terceiro dia que nos encontrávamos fingindo que era por acaso. Entre nós pairava uma nuvem de intimidade e só era o terceiro dia. Nessa cena, na qual éramos atores e público, eu fazia o papel de um fumante compulsivo e ele de um barbeiro que estava ao telefone com a namorada. Quando a namorava desligava, depois de muitos desliga-você-primeiro, ele me perguntava o que eu queria e qual era meu nome. Eu poderia mentir, falar qualquer outro, mas eu respondia o meu nome primeiro. Com o devido cuidado soletrei as letras, primeiro o jota de jibóia. Ele não entendeu nada, pediu pra eu repetir, enquanto eu pensava que o jota poderia ser de janela e não de jibóia. Isso deixava as coisas claras demais. Em retaliação à ignorância dele ou a falta de audição e tato, não quis saber o seu nome.

#3

Não sabia muito o que ele queria comigo. Tínhamos poucas coisas em comum. Estudamos na mesma universidade e ele conhecia meu namorado. Conversamos sobre peças de teatro ou filmes que estavam em cartaz, já que ele sabia que eu era atriz. Eu me dizia atriz, mas no fundo mal conseguia me ser – quanto mais ser outras. Lembro que o telefone tocou e eu não reconheci o número. Depois de algumas charadas e jogos de palavras soube que era ele, me convidava para uma sessão de cinema aquela noite. Topei sem cerimônias, às sete horas em frente ao mate. Entre a gente não existia tensão sexual por vários motivos. O interesse dele em mim era outro, algo que eu não dominava bem e me botava curiosa. Cheguei antes do combinado e ele já estava lá. Aparentava mais magro que dá ultima vez, com os cabelos meio grandes demais. Estava acompanhado de um tipo indefinido. Nem alto, nem baixo, barba rala, olhos pequenos parecendo duas poças d’água suja. Lembro que a testa dele brilhava, refletia o luminoso da fachada da loja. Era cedo demais pra entrar na sala e decidimos comer alguma coisa. Pedi uma água tônica, expliquei que era por causa de uma azia insistente. Aquele que era mais meu amigo deu uma risada, investigou a minha azia e todos meus problemas gastrointestinais. Perguntou o porquê de não ter trazido meu namorado ao cinema e como estava nossa vida amorosa, se transávamos muito ou se atores gostavam das coisas só no palco. O outro rapaz observava e sorria muito, tentando participar da conversa. Talvez ele achasse engraçada a intromissão do seu amigo na minha vida. Será que eles eram amigos ou primos, irmãos? Não lembro. O que eu lembro é que em algum momento – o único espontâneo naquela noite - o rapaz de olhos sujos tomou um ar, pediu licença e virou o meu rosto de perfil. Ficou me olhando e perguntou pro companheiro: lembra aquele filme que vimos semana passada, estrangeiro... Qual era o nome daquela atriz mesmo? E o outro, aquele que eu julgava um pouco amigo, não respondeu nada. Sua boca sequer abriu, não saiu um A, um ar, nada. Só sabia me olhar e não dizer nada. Aqueles cinco segundos duraram muitos, e, antes de tudo ficar mais constrangedor, mudei de assunto, falei para nos apressarmos para o filme. Mas o que eu ia falar não era bem isso, era outra coisa.

#2

Era uma segunda-feira de carnaval estranha de um ano parecido. A última alternativa era estar com ele entre pessoas desconhecidas. Um quarto de casa grande em uma cidade cinza com nome de índio. Pessoas se divertindo ou acreditando estarem se divertindo. Às vezes se ouvia algum sussurro, uma reclamação entre os dentes batendo no copo de vidro. Algo sobre a música alta ou mosquitos. Naquela noite, no quintal sem iluminação, ele perguntou sobre a minha vida – quem sabe por curiosidade ou protocolo. Disse que eu estava morto e seco por dentro, terreno agreste, mas tentaria manter a normalidade, seria simpático ali naquele lugar inóspito. Me fantasiar de algo até o dia de cinzas. Lá longe, a única luz de um poste de rua coroava a cabeça dele. Um cristo que pesava a minha resposta. Talvez ele me absolvesse, indicasse alguma simpatia, um xarope ou apertasse a minha mão. Mas me deu um sorriso sincero com todos os dentes possíveis onde era possível ler: você não sabe nada da vida. No dia seguinte acordei e ele tinha partido depois de algumas ligações. Nunca mais nos encontramos.

#1


Teve o dia em que fui te conhecer. Na verdade não era isso, era outra coisa. Já tínhamos nos visto uma vez de forma muito breve, coisa de cinco minutos. Lembro bem, você parecia feliz apoiado em um peito que parecia seu. Acariciando um braço que te era muito familiar. Mesmo que naquela época eu desgostasse da felicidade dos outros, teu sorriso não me incomodou. Quando declaramos os interesses, acordei mais cedo para comprar uma camisa nova. Aquela ocasião, aquilo que parecia um passo adiante, não mais pros lados nem para trás, pedia uma camisa nova. Ali, no nosso encontro, mesmo antes dos cumprimentos e gracejos, você me mediu com os olhos de ponta a ponta. Comentou sobre a barba que me caia bem e percebi que algo em mim não te agradava. Não podia ser a camisa nova, imaculada demais de qualquer coisa que fosse. Na hora pensei: são os meus joelhos. Eles eram escuros demais, chamavam a atenção numa bermuda um pouco curta e te ofendiam. Você tentava disfarçar com a boca o que dizia com os olhos embotados - só podiam ser os meus joelhos. Enquanto decidíamos o que fazer daquelas horas, talvez você tenha descoberto que a culpa dos joelhos escuros era minha e não da natureza. Talvez naquele momento você descobriu que eles eram escuros por conta das noites que passei ajoelhado rezando e pedindo para que aqueles momentos nunca mais se repetissem.